Os dados do Censo Escolar 2021, divulgados recentemente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), acenderam algumas luzes de alerta no painel de controle da educação nacional. Informações sobre matrículas, evasão, docentes e instituições são uma parte importante, porém insuficiente para uma leitura coerente do complexo cenário da Educação Básica brasileira. Quando outros dados sobre aprendizagem se somarem a esses, será possível uma leitura mais completa da realidade das escolas e da educação. Ainda preliminares, os dados sobre aprendizagem remetem ao contexto, já precário de nossa realidade, diante da educação mundial.
Há uma dificuldade da coleta dos dados e da leitura coerente das informações, sendo desafiador pensar e implementar soluções afetivas e efetivas para a educação. Uma crise sempre pode e deve ser vista por diferentes ângulos. O curioso e fascinante é a possibilidade de oportunidades que a crise pode proporcionar, quando se consegue fazer a leitura coerente do contexto, somado a forças em prol do objetivo comum. E qual seria esse objetivo? O desenvolvimento humano e da sociedade, por meio da educação.
O Censo Escolar demostrou que houve uma redução significativa de matrículas na Educação Básica de 2019 para 2021. Em 2019, havia 47.874.246 matrículas; em 2020, 47.295.294 e, em 2021, uma redução de 1.205.845 em comparação a 2019, totalizando 46.668.401 matrículas. Em 2021, cerca de 1,4 milhão de estudantes de 5 a 17 anos não frequentaram a escola.
O maior impacto foi na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental que, juntos, somaram 1.138.226 matrículas a menos em relação a 2019. Das mais de 600 mil crianças não matriculadas na Educação Infantil, 95% estavam na rede particular. Houve queda de 21,6% de matrículas na rede privada, enquanto, na rede pública, de 2,3%; um segmento que vinha crescendo até 2019, conforme dados dos censos anteriores.
O Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado em 2014, com objetivos para serem alcançados ao longo de 10 anos, traz em uma de suas metas atender 50% das crianças em idade de creche e 100% na idade de pré-escola. Ou seja, os dados sobre matrículas nesse período da pandemia aumentam ainda mais o desafio de atingir tais números.
No Ensino Fundamental, essa diferença foi de mais de 400 mil matrículas, sendo que nos anos iniciais chegou a quase 500 mil. Nos anos iniciais, mais de 50% dessa redução foi na escola particular, ficando mais acentuada nos primeiros anos e diminui o percentual nas séries seguintes. Nos anos finais, houve aumento de mais de 70 mil matrículas em relação a 2019. E cerca de 50% dessas foram na rede particular.
Já no Ensino Médio houve um aumento de mais de 300 mil matrículas de 2019 a 2021. Porém, na 1ª série desse segmento, é possível perceber uma redução de 230 mil matrículas nesse período. As matrículas na rede privada se mantiveram durante a pandemia (de 2019 a 2021). Esse é um dos segmentos da educação que menos sofreu com o impacto do fechamento das escolas, seja pela autonomia do estudante e/ou pela facilidade de acesso a recursos tecnológicos para a aprendizagem.
Esses números sinalizam um movimento de migração entre rede particular e rede pública e, também, uma certa evasão – os dados publicados não mostram em qual rede a evasão foi maior. Onde estão os estudantes? Será que retornaram para as escolas em 2022? O que o censo de 2022 mostrará? A aprendizagem avançou?
No primeiro ano da pandemia (2020), houve um aumento de 66,3% no número de crianças de 6 e 7 anos de idade que, segundo seus responsáveis, não sabiam ler e escrever. O estudo publicado em fevereiro de 2021, pela ONG Todos Pela Educação, com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), feita pelo IBGE, mostra o aumento do percentual de 25,1% em 2019 para 40,8% em 2021. Isso significa 1 milhão de crianças a mais que não sabem ler e escrever nessa faixa etária. Esse é um dos impactos já observáveis da pandemia da covid-19 na alfabetização de crianças brasileiras.
A taxa de aprovação dos estudantes em 2020 em todas as séries é significativamente superior, comparada a 2019. Porém o contexto da pandemia permitiu certas adaptações no processo de ensino e de avaliação, logo uma maior taxa de aprovação não significa uma maior aprendizagem. Diferentes estratégias e ferramentas foram adotadas no desenvolvimento de atividades de ensino-aprendizagem durante a pandemia, assim como diferentes instrumentos de avaliação.
Outro dado, também importante, a ser utilizado como indicador comparativo no futuro, é o impacto da diferença de tempo em que as escolas ficaram fechadas. Alguns estados e cidades retomaram as atividades presenciais antes, outras, muitos meses depois. Será que as escolas que retornaram presencialmente antes conseguirão apresentar melhores resultados acadêmicos e de aprendizagem? O desenvolvimento emocional e social foi potencializado com as atividades e o convívio presencial nas escolas. Resta saber o impacto intelectual.
Para análise dos dados, vários fatores e variantes são importantes, incluindo os dados de 2022. Com isso, no próximo Censo e nas próximas avaliações nacionais, será possível o cruzamento de mais informações. No entanto o que os números atuais sinalizam são possíveis caminhos para reverter esse cenário. As crianças e os jovens não podem ser penalizados por isso.
É preciso agir com serenidade e urgência. Pensar, planejar e implementar novas políticas públicas com metas de curto, médio e longo prazo para escolas públicas e particulares, para a educação no Brasil. Ao se pensar na contribuição das escolas particulares para a sociedade, seja com a desoneração do Estado, seja na qualificação dos docentes e/ou nos resultados acadêmicos, não seria prudente pensar em um Pacto Nacional pela Educação? Fica a (pro)vocação!